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PM preside III Encontro de Embaixadores e Organizações Internacionais acreditados em Cabo Verde

"Enfrentar a Conjuntura Internacional, Alargando e Reforçando Parcerias"

Reunião Conjunta Governo de Cabo Verde – Representantes diplomáticos

S. Vicente, 31 de Janeiro – 2 de Fevereiro

Intervenção de abertura do Encontro proferida por S.E. o Primeiro-Ministro, Dr José Maria Pereira Neves.

Permitam-me começar estas minhas palavras lembrando o povo irmão do Haiti, que vive momentos de grande angústia. A nossa mensagem é de solidariedade e de reconforto.

Saúdo a presença das distintas Embaixadoras e dos distintos Embaixadores e Representantes dos organismos internacionais em São Vicente de Cabo Verde, ilha do Porto Grande, cuja história se confunde com o movimento de partidas e de chegadas, com o encontro de civilizações e de culturas, o que confere a esta ilha um carácter marcadamente cosmopolita. Receber bem os que chegam faz parte das boas tradições vicentinas e, portanto, estou certo que se sentirão em casa, como desejamos.

Esta é uma boa oportunidade para mantermos um diálogo produtivo com os nossos parceiros da comunidade internacional.

Vou falar-vos um pouco do que temos feito, do que temos pela frente e sobre como podemos trabalhar juntos para reforçar a nossa parceria.

Digo-vos que os cabo-verdianos e as cabo-verdianas têm trabalhado duro para merecer a vossa confiança. Nunca é demais agradecer a vossa contribuição e esta é boa hora para renovar o nosso reconhecimento.

Aqui, nestas ilhas, inspiramo-nos em Amílcar Cabral. O seu ideário marcou o primeiro Programa de Governo, logo após a Independência, em 1975, que estipulara que a responsabilidade primeira do desenvolvimento caberia aos cabo-verdianos. Tão simples como isso, mas que tem sido um pressuposto determinante no percurso que o país tem feito, desde há 35 anos.

Certo que nestas ilhas ainda temos imensos desafios pela frente. Mas, quando olhamos 35 anos atrás, vemos o caminho percorrido em tão pouco tempo, partindo de uma situação de desesperança inimaginável, quando vejo as instituições, as pessoas, a economia, digo que as cabo-verdianas e os cabo-verdianos têm razões para levantar a cabeça. Hoje, Cabo Verde é um país possível. Hoje, Cabo Verde é país de rendimento médio, está na linha da frente dos países africanos para atingir os ODM. O povo cabo-verdiano tem sido o grande ganhador, pois as cabo-verdianas e os cabo-verdianos vivem melhor, estão mais instruídos, mais capacitados e mais livres.

Como já tinha dito em outras circunstâncias, a melhor forma de Cabo Verde vos agradecer é provar que o desenvolvimento é possível em Africa, é mostrar aos contribuintes dos vossos países que o esforço deles não é em vão. E é esta a nossa modesta contribuição para o crescimento da humanidade.

Cabo Verde vem tendo um crescimento robusto. Mais recentemente, entre 2006 e 2008, e não obstante as tensões ligadas aos preços dos alimentos e dos combustíveis, tivemos um crescimento médio de 8,6%, tendo alcançado os 10,1% em 2006. Em 2008 e em 2009 sentimos claramente os efeitos da devastadora crise internacional.

Sectores como o turismo, sobretudo, o turismo imobiliário, e a construção civil, foram os mais afectados. Registamos em 2009 uma diminuição das receitas fiscais em cerca de 11,4%; as receitas do turismo também desceram de um terço e, fruto da desconfiança generalizada nos mercados, o investimento directo estrangeiro sofreu uma sensível redução, que se estima um pouco acima dos 50%.

Tomamos medidas imediatas. Reduzimos a carga fiscal sobre os rendimentos das empresas em 5 pontos percentuais, reduzimos a carga fiscal sobre as famílias, e tomamos outras medidas parafiscais e de acomodação das dívidas das empresas para com o Tesouro, aumentamos as pensões sociais, tudo para proteger a competitividade das empresas e o poder de compra das famílias. Além disso aumentamos substancialmente os investimentos públicos, sobretudo na modernização das infra-estruturas económicas e sociais.

As previsões indicam uma taxa de crescimento de 5% para 2009. Pensamos que saímos razoavelmente bem da crise. Pelo menos é o que acredita o FMI, quando diz, na sua mais recente avaliação, que Cabo Verde geriu bem a crise. O mais importante é termos conseguido manter o equilíbrio dos fundamentais da economia.

Mas falemos do futuro.

 A nossa Agenda para enfrentar a conjuntura nesta nova etapa é acelerar o processo de transformação da economia e da sociedade que o país vem seguindo.

O que queremos é melhorar a competitividade do país e expandir e diversificar a base produtiva.

O que queremos é modernizar as instituições públicas e as empresas, em linha da convergência técnica e normativa com os países mais desenvolvidos, na esteira da adesão à OMC e da Parceria Especial com a União Europeia.

O que queremos é construir sobre os progressos alcançados e dar um salto qualitativo decisivo, para qualificar o país e a sociedade e colocar definitivamente a economia num patamar de sustentabilidade.

A boa governação tem sido um recurso estratégico para o país, o nosso petróleo diria mesmo. Só com boa governação é possível proceder às reformas necessárias, uma condição indispensável para a transformação do país. Só com boa Governação é possível garantir o equilíbrio dos fundamentais da economia, o rigor, a transparência e a prestação de contas, só com boa governação é possível realizar o bem comum, só com boa governação há credibilidade e confiança junto aos parceiros internacionais.

Temos dito à exaustão, ao longo destes últimos anos, que a competitividade é determinante.

Tenho para mim que a melhor e a mais duradoura resposta à conjuntura de crise internacional é construirmos factores de competitividade a nível do país e a nível de sectores motores como o turismo. Assim, estaremos a transformar a crise em oportunidades para alicerçar o desenvolvimento em bases mais sólidas.

A competitividade tem a ver com a modernização das instituições. Tem a ver com a simplificação dos procedimentos administrativos e a melhoria do ambiente de negócios. É por isso que está na nossa agenda uma profunda reforma da administração pública para fazer face aos novos desafios emergentes. Temos tido grandes avanços no domínio da governação electrónica e integrada, criamos a Casa do Cidadão, que constitui uma autêntica revolução no relacionamento entre a administração, as empresas e os cidadãos, e construímos outras importantes ferramentas de gestão como o SIGOF, para melhorar a eficiência e a eficácia da gestão financeira do Estado e aumentar a sua transparência, o sistema de informação e gestão municipal, o sistema nacional de identificação e autentificação civil, ou ainda, o sistema eleitoral.

A nossa meta imediata é Cabo Verde ser um dos "Best performer" do Doing Business em 2010. Estamos preparados para isso.

Competitividade tem a ver com as infra-estruturas. O Ministro de Estado e das Infra-estruturas, Transportes e Telecomunicações falar-vos-á disso com mais profundidade e dos grandes progressos que o país está a fazer neste domínio. Deixem-me adiantar-vos que se trata de um aspecto decisivo para a competitividade do país, pois as infra-estruturas são cruciais para assegurar que temos capacidade para integrar a economia nacional e assegurar que estamos activamente inseridos ao mundo. E, numa economia arquipelágica, esta questão assume contornos que são vitais para o país.

Responder à crise internacional de forma duradoura é expandir a base produtiva e criar oportunidades de negócio e investimentos e provocar mudanças estruturais na economia.

O turismo, sector motor, deve estar em condições de um rápido crescimento na pós crise. O que pretendemos é posicionar melhor o país no mercado turístico, removendo constrangimentos ainda existentes, diversificando a oferta e aumentando a competitividade do sector. Conseguindo isto, teremos transformado esta crise em oportunidade, respondendo a um desejo conjunto do Governo e do sector privado.

Temos prestado toda a atenção à agricultura. Agora com um olhar novo, de modernização, de aumento da produtividade, de empresarialização, que já está a dar frutos. Prosseguimos com investimentos na mobilização da água, em tecnologias modernas de rega, no reordenamento das bacias hidrográficas, bem como na melhoria do acesso ao crédito e a mercados.

Expandir a base produtiva é também investir em novas áreas de oportunidade, em novos "clusters". É por isso que quisemos que o "Cluster do Mar" fosse um dos temas chaves deste nosso encontro, porque se trata de uma temática de grande importância para o país. Se o território nacional é pequeno, dispomos contudo de um espaço marítimo vastíssimo, em pleno atlântico, na encruzilhada de rotas que unem os continentes africano-europeu-americano. È crucial para nós explorar todas as riquezas deste nosso imenso mar.

Quero chamar a vossa atenção para 3 componentes essenciais dessa estratégia:

Primeiro, transformar Cabo Verde numa plataforma de transportes aéreos e marítimos internacionais, uma espécie de "gateway" to África, Europa e Américas;

Segundo, construir um centro regional de pescas, para prestar serviço às frotas de pescas atlânticas, desde o processamento e a stockagem do pescado, o marketing e a exportação, a reparação naval, o acolhimento e a troca de tripulação, ou, ainda, a prestação de serviços afins como finanças e seguro;

Terceiro, criar as condições para o desenvolvimento de pesquisas oceanográficas.

A par do "cluster" do Mar, estamos a apostar em novos domínios. Temos o sector das tecnologias do conhecimento. Queremos construir uma economia à volta das tecnologias do conhecimento. Já demos passos importantes, quer no desenvolvimento da infra-estrutura, como no que concerne à capacidade humana. Referimo-nos, por exemplo, ao E-Gov, domínio em que Cabo Verde tem merecido referências internacionais, ou, ainda, ao programa "Mundu Novu" de introdução das TIC nos sistemas de ensino, etc. Enfim, não sei se algum dos nossos visitantes já experimentaram, mas basta irem à praça aqui ao lado, para estarem conectados à Internet, como já acontece em inúmeros espaços públicos do país.

A energia é um grande desafio. Desafio que pretendemos ganhar com uma aposta forte no desenvolvimento das energias renováveis. Com os investimentos em curso pensamos atingir uma taxa de penetração das energias renováveis de 25% já no próximo ano. Estamos assim a caminhar para a realização da nossa meta que é a de conseguir uma taxa de cobertura de 50% em 2020. Temos em Cabo Verde excelentes condições para as energias renováveis, particularmente a eólica e a solar, mas também a oceanográfica e geotérmica. Será instalado em Cabo Verde o Centro Regional para as Energias Renováveis da CEDEAO e isso também vem potenciar o surgimento de uma indústria ligada às tecnologias de energias verdes e renováveis.

Seguimos apostados na construção de uma plataforma de prestação de serviços financeiros e afins. Em resposta à crise, que veio trazer novos paradigmas globais para o mundo financeiro, estamos a revisitar toda a legislação para pôr de pé um sistema jurídico-institucional vocacionado para esta nova era.

O que há de mais forte e rico em Cabo Verde é, sem sombra de dúvidas, a cultura. A música cabo-verdiana, por exemplo, está a ter larga aceitação a nível mundial. O nosso património cultural ficou enriquecido com a recente elevação da Cidade Velha a Património da Humanidade. Quando vemos o enorme peso das indústrias culturais no PIB de países desenvolvidos como os Estados Unidos da América ou a Grã-Bretanha, vemos claramente que temos possibilidade de desenvolver em Cabo Verde um sector de indústrias com base na cultura.

E deixo para o fim talvez o mais importante que é o desenvolvimento do capital humano, a prioridade das prioridades. Já estamos a dar passos para alargar o ensino obrigatório e ter todos os jovens até à idade dos 18 anos no sistema de ensino e formação. O programa "Mundu Novu" vai permitir que mais de 150 000 alunos e professores tenham acesso a computadores e a informação. Estamos a consolidar o sistema de ensino superior que já conta com mais de 10.000 estudantes. A Universidade de Cabo Verde está a alinhar-se com os princípios de Bolonha e tem parcerias com várias das vossas universidades, para melhorar a qualidade do ensino. Com o recurso às tecnologias de informação e de comunicação, queremos tornar o ensino superior acessível a todas as ilhas.

A nossa aposta é forte na formação profissional que é vital para a melhoria da produtividade e, consequentemente, da competitividade. O sistema de formação profissional está em franca expansão em todas as ilhas. Estamos a ligar a vertente formação profissional ao ensino secundário e também ao ensino superior, oferecendo assim aos jovens mais oportunidades.

Senhoras Embaixadoras e Senhores Embaixadores, estas são as nossas repostas para enfrentarmos a difícil conjuntura internacional e conseguirmos um desenvolvimento sustentado e alicerçar a economia em bases sólidas, criar emprego, combater a pobreza, as desigualdades e todas as formas de exclusão social. Esta é a nossa agenda, o que prova que este país tem uma visão e um rumo.

A nossa mensagem é clara: o que queremos da comunidade internacional é uma forte parceria para a aceleração do ritmo de execução desta agenda de transformação. Estamos empenhados na realização desta agenda e queremos contar com o vossa parceria.

O processo de graduação do país ainda está em curso. A comunidade internacional comprometeu-se a acompanhar Cabo Verde numa fase de transição para evitar medidas que perturbem a trajectória de desenvolvimento. A avaliação que fazemos da graduação é claramente positiva. Mas a nova situação, de país de rendimento médio e a dinâmica de transformação subjacente, acarreta necessidades de financiamento muito maiores do que no passado.

Precisamos, pois, ter acesso a novos e adicionais instrumentos e mecanismos de financiamento do desenvolvimento. Em Agosto do ano passado, referi à Sra. Hillary Clinton, aquando da sua visita a Cabo Verde, que é necessário que a comunidade internacional também considere premiar o mérito, encorajando as experiências positivas. Ela pareceu concordar com a tese e vejam a atribuição de um segundo Compacto do MCA.

Esta nova situação interna, aliada ao contexto externo global, mormente em conjunturas de crise como a actual, obriga-nos a pensar o lugar de Cabo Verde no mundo e, em particular, a procurar âncoras junto a espaços social e economicamente mais dinâmicos. Por isso, é para Cabo Verde fundamental e estratégico alargar e reforçar parcerias, na linha do que vimos construindo de modo inovador com a União Europeia.

Cabo Verde é uma Nação aberta ao mundo, pela sua história, pela sua condição atlântica, na encruzilhada de rotas e de civilizações, pela sua cultura multifacetada e pela presença de uma numerosa diáspora espalhada pelos diversos cantos do mundo. 

Por isso, Cabo Verde quer ser um país útil ao mundo e as parcerias com países ou entidades de governança regional são espaços privilegiados para a exploração de ganhos mutuamente vantajosos.

Pensamos também em parcerias focalizadas num objectivo estratégico, por exemplo, para construir as plataformas de que vimos falando no domínio dos transportes, das finanças internacionais ou, ainda, de clusters como o do mar, o das tecnologias de informação e comunicação, ou o das energias renováveis.

É também no quadro de parcerias que Cabo Verde quer continuar a trabalhar para vencer as ameaças à segurança no Atlântico médio e sul e transformar este espaço em zona de paz e cooperação para o desenvolvimento.

Estamos convencidos que a construção de parcerias, na ideia de funcionar como ponte para a nossa sub-região, contribui para a consolidação da inserção competitiva de Cabo Verde na CEDEAO. O mesmo poder-se-á dizer em relação ao espaço da macaronésia constituída por Cabo Verde, Canárias, Açores e Madeira.

Pois bem, distintas convidadas e distintos convidados, procuramos, mesmo que de forma sintética, esboçar o pano de fundo enquadrador do nosso encontro, na certeza de que os debates que aqui terão lugar contribuirão para o seu aprofundamento.

Digo-vos que vós sois os Embaixadores de Cabo Verde. Queremos que cada um de vós seja um amigo deste pequeno país que é Cabo Verde. Haverá melhor parceria do que isso?

Espero que a vossa estadia em S.Vicente seja agradável. S.Vicente é uma ilha acolhedora e reza a tradição que quem a visita fica para sempre um amigo. Como diz o poeta da morna, "Mindel é terra ki Deus espaiá sê ligria e sê Porto Grande é um coração abert pá recebê nos kond nô torná voltá". Então, voltem sempre.

Muito obrigado.